sexta-feira, 3 de outubro de 2014

O país que somos

Jornal Notícias de Albufeira, 01 Abr. 2010

    O País que Somos

    A coisa está mal. E a culpa não pode ser atribuída ao povo, que tem sido ludibriado e enganado. Chegou-se ao ponto da maioria dos portugueses viver assustada com esta democracia exploradora que recorre a todos os meios, para financiar os seus devaneios. A população está a ficar empobrecida devido à inoperância de governantes que endividam o País e privilegiam uma classe de autênticos “lordes”.
    Recorrendo à história recente, os militares são considerados heróis libertadores. Mas que libertação, que fomentou o descontrolo e conduziu à ruína económica. Afinal, em nome de uma causa nobre, resolveram a sua situação e progrediram rapidamente nas carreiras. Hoje, são generais no activo, em clima de paz, com grandes ordenados e mordomias, ou vivem com altas reformas e outras regalias.
    Aconteceu de tudo: nacionalizações, ocupações, reforma agrária, saneamentos, e, em nome da revolução, os meios de produção entraram em colapso e as reservas foram delapidadas.
    Seguiu-se uma classe de políticos e de gestores, determinada a alimentar a ilusão delirante do povo, financiada pelo orçamento do estado, no estrito cumprimento da ética revolucionária. Escusado será dizer que, uma das moedas mais fortes do mundo, em 1973, não tardou a ver a sua economia ser “assistida” pelo FMI.
    A reforma agrária foi desmontada, mas faltou rigor no uso dos fundos estruturais, tanto, no sector agrário como nas outras áreas da economia. Houve desnacionalizações e entrega de património aos antigos donos. Com a retoma dos grupos económicos, os políticos mostram, de novo, a sua habilidade. Passam pelos governos, colocam os “boys” e criam empatias para benefícios futuros.
    A moeda desvalorizou-se, continuadamente, e a inflação chegou a ser superior a 30%. Logo, na troca do Escudo pelo Euro, os portugueses foram penalizados. A coisa só não foi pior porque os governos do Prof. Cavaco Silva contiveram a dívida externa e fizeram cair, substancialmente, a inflação.
    Congratulo-me com a liberdade de expressão, que é património do 25 de Abril. Mas, 36 anos depois, tenho alguma dificuldade em contrariar os que dizem que, se não fosse a revolução, Portugal vivia em democracia, tal como a Espanha. A descolonização teria sido concretizada. O País pertencia à EU e tinha aderido à moeda única, em condições de convergência mais vantajosas.
    Nos últimos dez anos, a situação agravou-se com a globalização e com as más políticas que têm sido seguidas. A falta de competitividade e a deslocalização de unidades fabris penalizaram a balança comercial e fizeram disparar o desemprego.
    Este modelo económico não satisfaz. As parcerias público-privadas são, tendencialmente, lesivas para as contas públicas, ou significam divórcio parcial do estado em relação às suas responsabilidades.
A estratégia de investimento público está desajustada das necessidades e não há incentivo para o crescimento económico. Às auto-estradas sem tráfego junta-se-lhes os custos de manutenção e a necessidade de portajar as scut.
    O TGV, Lisboa – Madrid, pretende ser pretexto para atrair madrilenos, às praias da linha do Estoril, mesmo que a passagem aérea, numa low cost, seja mais barata. O investimento não é rentável, compromete gerações futuras, e incentiva a deslocalização de mais centros de decisão para Espanha.
    Perante a hipótese do aeroporto da Portela esgotar a sua capacidade, o governo quer Alcochete para plataforma intercontinental. Importa considerar o declínio de algum tráfego aéreo no mundo e perceber que as companhias aéreas de formato low cost, em expansão, colocam as taxas como condição para a sua operação.
    Fazia sentido escalas técnicas, para o reabastecimento de aeronaves, nalguns vôos intercontinentais, se a capacidade de autonomia não tivesse evoluído. Mas, escalar Portugal, para distribuir passageiros, duvido que alguma vez seja opção.
    A decisão política, destes investimentos, terá contemplado as construtoras. Até pelo facto do novo aeroporto implicar noutra ponte sobre o Tejo.
    Uma das apostas correctas, seria olhar o mar com outra ambição. Criar plataforma de transporte marítimo, de mercadorias, em Sines, de e para os continentes americano e africano, com interface de ferrovia e rodovia, para escoar e abastecer uma boa parte do território espanhol.
    No Parlamento, os deputados ensaiam quezílias, enquanto o governo move os seus “boys” e diverte-se a atirar esmola a uma faixa considerável de dependentes, que já se tornou submissa.
    Sobre os casos mais mediáticos da actualidade, que vão apodrecer nas mãos da Justiça, já toda a gente percebeu que a teia da promiscuidade é emblema forte dos falsos democratas da nossa praça.
    A Comissão de Inquérito Parlamentar, criada para o caso PT / TVI, acabará por concluir a sua avaliação política. Mas, sendo Portugal um País perverso, em que muito está invertido, duvido que a parte dos seus membros, aparentemente tocada pelo desenvolto instintivo de alguns inquiridos, não tenha de vir pedir desculpa pelo incómodo destas sumidades prodígias, interessadas na defesa do “chefe”.


Henrique Coelho

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