Exmo. Senhor,
Dr. José Carlos Martins Rolo
8200 ALBUFEIRA
Assunto: Regulamento dos Horários de
Estabelecimentos
Está em marcha um desmesurado acerto de contas, com a
economia local, por força do novo Regulamento em epígrafe.
Antes, os horários estavam adequados às diferentes actividades
e os parâmetros do ruído, determinados pelo Regulamento do Governo Civil, eram
respeitados pelos estabelecimentos.
A história da música exageradamente alta, ou seja do ruído
incomodativo, prende-se com o prolongamento do horário dos bares, concedido
pela Autarquia, e com o incentivo que foi dado, a partir do inicio da década de
90, tanto pelo presidente da câmara, daquela altura, por interesses
particulares, como pelo que acabou de interromper o seu mandato. Sendo que, o
incentivo deste último, foi incompreensivelmente superior, com facetas pelo meio.
A “noite de Albufeira”
recebeu elogios, no discurso verbal, para, a seguir, o mesmo protagonista condenar
o ruído, na escrita.
Efectivamente, desde há muito que alguns bares encerram às
04h00 e emitem sonoridades de discoteca, com facilidades de dança e portas
escancaradas, para as esplanadas também usufruírem.
As discotecas arrombaram paredes e puseram os balcões na
rua, para não perderem competitividade. E, como se não chegasse, a Autarquia
promoveu espectáculos ruidosos, à borla, que rotularam Albufeira de “pimba”, dificultaram o desempenho de
muitos estabelecimentos, e contribuíram para o elevado passivo que é, hoje, um
pesadelo.
Estou à vontade nestas matérias, sobre as quais tenho dado
testemunho, desde Maio de 1994, altura em que houve uma reunião, promovida pelo
Senhor Governador Civil de Faro, no Hotel Montechoro, para discutir o ruído.
Passaram-se quase 20 anos e havia necessidade de resolver
o problema. Porém, o método adoptado, com base no novo Regulamento dos Horários,
está longe de ser uma solução justa, equilibrada, e pacífica. É um ponto de
partida, que já terá dado muito trabalho, mas o assunto não deve ser
considerado encerrado.
As pessoas que trataram desta questão não demonstraram
sensibilidade nem conhecimento da matéria. Muito menos, perceberam que a Autarquia
tinha responsabilidades nesta desordem.
As dificuldades de tesouraria e a fuga do ex-presidente já
resolveram o problema da assiduidade dos espectáculos ruidosos, mas falta a
Autarquia identificar e reagrupar os estabelecimentos, por tipos de actividade,
de acordo com os alvarás que concedeu e os serviços que estes prestam. E, nalguns
casos, mandar reimplantar as condições de isolamento sonoro que alguns tiveram
no passado.
Os bares, atrás referidos, tinham de virar as colunas de
som, para o seu interior e baixar volumes. E as discotecas voltarem a colocar os
balcões dentro de casa e reerguer paredes.
A partir daí, na minha opinião, todos os bares deviam estar
autorizados a funcionar, até às 02h00, de Novembro a Abril, e até às 03h00 de
Maio a Outubro, ambos inclusivé, com nuances no Carnaval e Páscoa, até às
03h00, e no Fim de Ano até às 08h00.
Por sua vez, as discotecas, (dancings, boîtes, e cabarés), eram autorizadas a funcionar até às
06h00, todo o ano, com a nuance de Fim de Ano até às 08h00.
Os restaurantes, snack bares, cafés, pastelarias e outros
congéneres, teriam horários de funcionamento até às 24h00, até à 01h00 ou até
às 02h00, em função das pretensões dos seus proprietários.
Em situações excepcionais, de acordo com as localizações e
respectivas condições de operacionalidade, alguns restaurantes e snack bares, com
horários de terceira linha, podiam ser autorizados a funcionar até às 03h00, de
Maio a Outubro, e destes, ainda, ser dada autorização, a um grupo muito
restrito, para funcionar até às 06h00, todo o ano, para refeições tardias, com
a mesma nuance de fim de ano, até às 08h00.
Não tem de haver pudor na análise de factos reais. Uma
pessoa que se deite às 7 ou 8 horas da manhã, por norma, não almoça. Nesta
perspectiva, havia interesse em incentivar a refeição tardia, para quem trabalha,
em horários nocturnos, ou gosta da noite.
As actividades nocturnas, também dão mais segurança à
cidade.
Não faz sentido que os estabelecimentos do comércio
tradicional estejam abertos, depois da meia-noite, à excepção das farmácias,
por escala, e das lojas de conveniência dos postos de combustíveis, a funcionarem
24 horas.
Todos os estabelecimentos tinham de cumprir as regras
restritivas do ruído, para o exterior, consignadas na lei e harmonizadas por
regulamento adequado à realidade local, especialmente, a partir das 24h00.
Não teria relutância em concordar com os limitadores de
som, instalados nos bares, se o actual regulamento contemplasse o que atrás referi
e se o histórico das casas fosse, minimamente, tido em conta na atribuição dos
respectivos volumes. Mas, o que se verifica, na prática, é uma tendência para restringir
quem não prevaricou, nem foi objecto de queixas, no passado.
O regulamento cria situações novas, algo caricatas.
Nalguns casos, incentiva o ruído, tem excessos, lacunas, e é abusivo.
Não altera nem contraria a postura dos bares e das discotecas
que entraram em rota de colisão, nas estratégias e nos objectivos, e que se serviram
da indulgência desregulada da Autarquia. E são estes estabelecimentos que, comprovadamente,
produziram, e continuam a produzir, o ruído incomodativo que interessa evitar.
Não faz alusão à prestação dos serviços de restauração e
bebidas, dos hotéis e das outras organizações turísticas, nem refere os
ambulantes do artesanato oriental e dos cachorros. Estas omissões configuram um
quadro estranho e são incitadoras à concorrência desleal.
Os próprios serviços da Autarquia vão ser sobrecarregados,
com um movimento acrescido, para tratar de autorizações / licenças, que era
dispensável.
O regulamento dificulta os proprietários dos
estabelecimentos com música ambiente, depois da 24h00, cujas actividades
pretendem ser comedidas e não têm nada a ver com a “guerra” do ruído. Estes
munícipes, contribuintes, que já pagam por tudo e têm, agora, a factura de mais
equipamento, em tempo de crise, devem sentir-se rotulados, desconsiderados, e ofendidos.
Apesar de o equipamento ser calibrado e selado, por agentes
que facturam e decidem, unilateralmente, com o consentimento da Autarquia, os
donos dos estabelecimentos, ainda, são intimidados com um sistema de controlo “pidesco”.
Refiro-me ao software, desenvolvido com o estímulo da
Autarquia, para tratar dados e disponibilizar informação, dos estabelecimentos,
via internet.
Já se suspeita que o referido documento seja um
instrumento, para a “caça às bruxas”
que os seus mentores idealizaram. Intitula-se regulamento dos horários, mas
pretende resolver o problema do ruído. Mistura realidades díspares e omite
situações flagrantes. Alberga um conjunto de normas, absurdas, que vão desde as
mais graves, destruidoras de negócios, com todas as consequências, a outras,
ultrajantes, que ferem sensibilidades e encaixam mal nas culturas enraizadas,
para as diferentes actividades.
De facto, este regulamento suscita muitas dúvidas. Houve
um período de discussão pública e foi aprovado por um órgão eleito
democraticamente. Tudo dentro das normas. Mas onde fica a moralidade? E quem
envolveu a Autarquia, neste sarilho, estará a prestar um bom serviço público?
Por último - não será este regulamento anticonstitucional?
De vez em quando, surge alguém com a pretensão de
atraiçoar direitos fundamentais. Há tempos, o governo quis controlar os
automóveis de privados, através de chip
nas matrículas. Agora, é a Autarquia de Albufeira que controla os estabelecimentos
de restauração e bebidas, pela internet.
Esta perseguição abusiva, não faz sentido. Há outro método
de fiscalizar e punir os infractores que violarem o equipamento para emitir
ruído incomodativo.
Percebe-se que o futuro deste país está nas estirpes com
iniciativas inovadoras. Nesta linha, a Autarquia terá sido contagiada e tornou-se
incubadora de start ups, para acolher
uma invenção que, segundo se consta, também despoletou o interesse de outras
edilidades.
Acredito que os seus mentores tenham registado a patente,
para acautelar direitos e cobrar royalties.
“Bem-haja a inovação tecnológica. Quanto tempo, ainda,
será necessário, para automatizar tudo e extinguir a nossa raça que só dá chatices
neste planeta. A coisa pode ser penosa, para o resto dos humanos, em situação
de reforma, mas muito fácil, para um qualquer robot, (made in china) a dirigir a Segurança Social, porque deixa de haver
desemprego”.
“Os parasitas
que ainda sobrevivem, nesta economia degolada, - que se lixem”.
Sarcasmos à parte, reconheço o benefício das novas
tecnologias, enquanto a inteligência artificial estiver ao serviço do ser
humano. Mas, está-se a ir longe de mais. Só na A-22 a função virtual subtraiu,
pelo menos, 150 postos de trabalho, para a auto-via desencorajar utentes, prejudicar
a economia da região, e sobrecarregar a EN-125, com aumento de acidentes e perda
de vidas.
Preocupa-me o facto das estruturas do nosso País estarem
desumanizadas. Quase 40 anos depois da revolução, alguns órgãos eleitos, “democraticamente”,
demonstram insensibilidade e muita falta de ética.
No âmbito privado, as carências não são diferentes. Por
onde andarão os dirigentes das associações empresariais. Será que não foram convidados,
para discutir o ruído e os horários, ou terão preferido não beliscar empatias e
continuar a cobrar quotas.
Um dia destes, vêm aí os robots e as suas organizações não
fazem falta.
A minha ironia não míngua a importância das questões nem a
sinceridade dos meus relatos. É a nuance democrática, que escolhi, para
elucidar a realidade dos factos e tornar as narrativas menos carrancudas.
Em boa verdade, estas e outras realidades não me
surpreendem. Não foi por acaso que o Jornal Notícias de Albufeira publicou, já
faz algum tempo, um conjunto de artigos da minha autoria, nomeadamente, sob o
título “Albufeira Precisa de Mais”,
que assenta, perfeitamente, nestas indolências.
Não pretendo respostas, mormente, daquilo que não lhe diz
respeito. Aliás, estou convencido que este regulamento dos horários é obra do
passado recente, protagonizada por alguma “irreverência exacerbada”, que é
preciso conter.
Tendo em conta a contestação que o referido regulamento
está a ter da economia local, julgo que V. Exa, na assunção das novas
responsabilidades, esteja interessado em reflectir, sobre o insólito, e a avaliar
a consciência que se forma fora dos meandros do poder instituído.
Pessoalmente, aconselhava-o a travar, de imediato, a inerente
acção executória desta deliberação, para o assunto voltar a ser abordado, por
pessoas avalisadas na matéria, de modo a ser reposta a ordem a contente de todas
as partes.
Confesso que depois de ter lido o documento, e
aperceber-me do disparate que este constitui, tive o apetite de ir, de novo,
para o jornal. Só não o fiz porque já tinha decidido manter-me, temporariamente,
em silêncio, por razões de consciência intuitiva.
Melhores cumprimentos,
Atenciosamente,
___________
Henrique Coelho
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